Nunca se soube tanto… e nunca se pensou tão pouco
Por Diego de Almeida
Vivemos em uma época curiosa. Talvez única na história humana. Nunca tivemos tanto acesso à informação e, paradoxalmente, nunca convivemos com uma massa tão expressiva de pessoas mal informadas, intelectualmente frágeis e orgulhosamente desinteressadas em aprender. A promessa era de iluminação coletiva; o resultado tem sido, em muitos aspectos, uma sofisticada forma de obscurantismo digital.
Entrementes, tornou-se necessário fazer uma distinção conceitual que raramente é respeitada no debate cotidiano: desconhecimento, ignorância e desinformação não são sinônimos — e confundi-los é parte do problema.
O desconhecimento é a condição mais honesta do ser humano. É simplesmente não saber. Ninguém nasce sabendo, ninguém domina todos os assuntos e todos nós transitamos, diariamente, por zonas inteiras do mundo que desconhecemos. O desconhecimento é fértil, pois dele nasce a curiosidade, o estudo, o aprimoramento. Dizer “não sei” sempre foi, e continuará sendo, um gesto de inteligência.
A ignorância, por sua vez, já é outra coisa. Não se trata apenas de não saber, mas de não querer saber. É a recusa deliberada do conhecimento disponível, o desdém pela leitura, pela escuta atenta, pela reflexão. A ignorância, diferente do desconhecimento, é frequentemente acompanhada de opinião forte, convicção ruidosa e uma desconcertante sensação de autossuficiência. É o sujeito que não estuda, não lê, não se aprofunda — mas fala com a segurança de quem acredita dominar o assunto.
Mais grave ainda é a desinformação. Aqui não estamos diante do vazio, mas do erro. O desinformado possui conteúdo, mas um conteúdo distorcido, falso ou manipulado. Ele acredita saber. E exatamente por isso se torna resistente à correção. A desinformação cria um fenômeno perverso: a ignorância convicta, aquela que se defende com agressividade e que transforma qualquer tentativa de esclarecimento em ataque pessoal.
O que torna tudo isso ainda mais inquietante é o cenário atual. Vivemos na era dos buscadores, das bibliotecas digitais, dos cursos gratuitos, das universidades abertas, dos livros acessíveis em segundos. Nunca foi tão fácil aprender. Ainda assim, nunca foi tão comum optar por não fazê-lo. A preguiça intelectual tornou-se aceitável, quase um traço cultural. Estudar passou a ser visto como esforço excessivo; pensar, como perda de tempo.
E nesse ambiente distorcido, os valores também se inverteram.
Hoje, vemos profissionais altamente gabaritados (médicos, professores, engenheiros, pesquisadores, cientistas) dedicando décadas ao estudo, acumulando títulos, responsabilidades e uma carga ética imensa, muitas vezes recebendo remunerações modestas e reconhecimento limitado. Ao mesmo tempo, assistimos a influencers digitais, rappers, celebridades instantâneas, frequentemente incapazes de concluir o ensino básico, acumularem milhões, influência e prestígio social, muitas vezes sem qualquer contribuição intelectual, cultural ou social proporcional.
Não se trata aqui de demonizar o sucesso financeiro ou artístico. Trata-se de refletir sobre o que estamos premiando como sociedade. Quando o ruído vale mais do que o conteúdo, quando a visibilidade vale mais do que o conhecimento, quando a opinião sem fundamento vale mais do que o estudo silencioso, algo está profundamente desalinhado.
Talvez o problema não seja apenas a ignorância, mas a sua celebração. Vivemos um tempo em que não saber não é mais vergonha - vergonha é parecer “complicado”, “intelectual”, “profundo demais”. O superficial tornou-se regra; o imediato, virtude.
E assim seguimos, cercados de informação, mas pobres de sabedoria. Capazes de acessar qualquer dado, mas incapazes de sustentar um raciocínio. Falando muito, ouvindo pouco. Opinando sobre tudo, compreendendo quase nada.
Talvez seja hora de resgatar um valor antigo e hoje quase subversivo: o compromisso com o melhoramento intelectual. Ler mais, estudar mais, ouvir mais, falar menos. Reconhecer o desconhecimento, combater a ignorância e desconfiar daquilo que parece informação fácil demais.
Abraços Fraternos.

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