quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

ENTRE OSSOS, SILÊNCIOS E REFLEXÕES...

 

foto Eduardo Ramos

Entre Ossos, Silêncios e Reflexões…

Por Diego de Almeida

Há alguns dias, o Irmão Eduardo Ramos, valoroso membro de nossa Loja Gênesis, enviou-me um conjunto de fotografias tiradas durante sua visita à célebre Capela dos Ossos, em Évora, Portugal. As imagens, confesso, chegaram a mim como se fossem fragmentos de um antigo sermão feito não com palavras, mas com poeira, argamassa e ossos humanos. E, entrementes, percebi que elas carregavam a mesma tonalidade moral e espiritual que tantas vezes buscamos dentro de nossos próprios Templos.

A Capela, construída pelos frades franciscanos nos séculos XVI e XVII, é uma das mais contundentes mensagens visuais da cristandade ocidental. Ali, mais de cinco mil esqueletos, homens, mulheres, crianças, anônimos todos, revestem paredes e colunas, compondo uma espécie de liturgia silenciosa sobre a brevidade da vida. A famosa inscrição na entrada, “Nós ossos que aqui estamos pelos vossos esperamos”, não é uma ameaça, mas um convite. Convite à consciência, ao despojamento, àquilo que os antigos chamavam de memento mori: lembra-te de que és mortal.

foto Eduardo Ramos

E ao contemplar as fotos enviadas pelo Irmão Eduardo, não pude deixar de lembrar da nossa própria Câmara de Reflexões, esse pequeno universo fechado onde o neófito se despede do mundo profano antes de nascer para uma nova jornada. Ali, cercado de símbolos de morte, silêncio e recolhimento, ele se vê diante das mesmas perguntas que a Capela dos Ossos grita em seu silêncio mineral:
O que tens feito da tua vida?
O que realmente importa?
O que ficará de ti quando o pó finalmente reclamar aquilo que lhe pertence?
foto Eduardo Ramos

A morte, essa velha desconhecida que todos evitamos nomear, sempre teve, para os maçons e filósofos, um papel pedagógico. Não como tragédia iminente, mas como mestra de prioridades. Observando as imagens da Capela, com seus crânios organizados em padrões quase geométricos, compreende-se que aqueles frades não pretendiam assustar ninguém; queriam, sim, suspender o visitante por um breve instante diante da verdade que todos fingimos ignorar: somos pó em trânsito, e nossa arrogância cotidiana é apenas uma distração daquilo que mais importa.

Entrementes, ironicamente, é preciso ir a um lugar onde a morte se expõe para lembrar-se de viver.

E talvez seja esse o maior ensinamento para nós, homens e mulheres que diariamente lutam contra o tempo, as agendas, as preocupações, os projetos que acumulamos como se fôssemos durar para sempre. No fundo, sabemos que não duramos. Mas esquecemos. E por isso nos irritamos com pequenas contrariedades, nos consumimos com disputas inúteis, desperdiçamos horas inteiras sem perceber o milagre simples de estar vivo.

foto Eduardo Ramos
As fotografias do Irmão Eduardo, especialmente aquela em que uma múmia repousa sob um vidro transparente, preservada na fragilidade que já pertence ao outro lado da existência, parecem sussurrar uma advertência: a vida não espera. Não adia. Não negocia. Ela passa. E passa rápido.

E se somos, como ensina a Câmara de Reflexões, convidados a refletir sobre o que verdadeiramente importa, talvez seja hora de olhar para as pequenas grandezas do cotidiano: o abraço apertado dos filhos e netos, o pão quente ao amanhecer, a brisa silenciosa que entra pela janela, a alegria discreta do trabalho bem feito, o afeto sincero dos que caminham conosco. Nada disso estará disponível para sempre.

Assim, meu caro leitor, permito-me concluir com uma síntese simples, quase doméstica, mas profundamente verdadeira: a consciência da morte é a mais eficaz professora da vida. Não para gerar medo, mas para gerar foco. Não para nos entristecer, mas para nos despertar.

E, enquanto isso, seguimos.
Entre colunas de ossos, câmaras de reflexão e o dia a dia que se desenrola, quase sempre sem alarde, diante de nós.
Que possamos, enfim, aprender a viver antes que o silêncio nos alcance.

Abraços Fraternos.

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