quinta-feira, 12 de junho de 2025

A Mulher como Símbolo na Tradição Maçônica: O Feminino que Habita o Imaginário Iniciático


 

A Mulher como Símbolo na Tradição Maçônica: O Feminino que Habita o Imaginário Iniciático

Por Diego de Almeida (do livro "Instruções para o Grau de Aprendiz Maçom")

É uma fascinante ironia que, embora historicamente excluída dos trabalhos físicos da Maçonaria dita “regular”, a mulher esteja profundamente presente no universo simbólico da Arte Real. Sua figura permeia mitos, alegorias e virtudes essenciais à senda iniciática, revelando que o princípio feminino sempre habitou o coração do templo simbólico, mesmo quando ausente sob suas colunas visíveis.

No plano arquetípico, a Verdade — meta última do Maçom — é tradicionalmente representada como uma mulher, por vezes velada, por vezes desnuda, revelando-se apenas àqueles que buscam com pureza de intenção. Tal imagem remete à ideia da verdade como essência delicada, difícil de ser plenamente desvelada, exigindo coragem, disciplina e iluminação interior.

A Sabedoria, por sua vez, guardiã da coluna Jônica, do Venerável Mestre, também assume traços femininos. A presença de Atena, a deusa grega da razão e da estratégia, ou da Sophia gnóstica, que ilumina o entendimento profundo do cosmos, remete ao feminino como fonte do discernimento necessário à construção moral do templo interior. Da mesma forma, a Justiça – com sua balança, espada e olhos vendados – personifica o equilíbrio, a equidade e a retidão, virtudes indispensáveis ao verdadeiro iniciado.

No mito de Hiram Abiff, é a figura da viúva, e por extensão, a mãe simbólica do Mestre, que evoca a ideia de origem e regeneração. O título de “filho da viúva” não é mero epíteto, mas uma afirmação da ligação do Maçom com a matriz primordial da criação e com o eterno feminino que sustenta e nutre a vida. A viúva representa a dor da perda e, ao mesmo tempo, a esperança de renascimento — um dos mais profundos ensinamentos da iniciação.

Essas imagens e arquétipos revelam que o feminino não é apenas tolerado ou esteticamente inserido na simbólica maçônica — ele é estrutural, fundador, essencial. É a matriz invisível que inspira o caminhar iniciático, a presença que oferece intuição, empatia, compaixão, equilíbrio e visão espiritual.

Nesse contexto simbólico, ganha destaque também a figura de Marianne, representação da Liberdade na iconografia francesa e ocidental. De rosto erguido, cabelos ao vento e, muitas vezes, com o barrete frígio sobre a cabeça, ela incorpora os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade — valores estes que também iluminam o caminho maçônico. Marianne, como símbolo da república e da emancipação dos povos, surge como expressão do feminino libertador, que quebra as amarras da ignorância e acende a tocha do conhecimento. 

Em um plano simbólico, ela é a guardiã da liberdade interior, a companheira invisível do Maçom em sua luta contra a tirania da matéria e do ego.

Portanto, o feminino na Maçonaria não é um corpo a ser incluído; é um princípio a ser reconhecido. Ele habita a alma dos ritos, os mitos de regeneração, os atributos das virtudes e o horizonte da perfeição moral. Ao reconhecer essa presença sagrada, não apenas se honra a Tradição — transcende-se o véu da exclusão e integra-se plenamente o humano em sua totalidade.


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