Fachada com seis colunas e
despojamento da ordem dórica imita os antigos templos grego. Foto: Fernando
Zequinão/Gazeta do Povo.
Grandes capitais brasileiras
torciam o nariz para o simbolismo no final do século 19. O Rio de Janeiro, por
exemplo, não estava mais interessado em cantar versos sobre morte,
transcendência e misticismo. Preferia o realismo e uma linguagem sem tanto
rebuscamento. Mas não Curitiba. Por aqui, como na Bahia e no Rio Grande do Sul,
o movimento se proliferou. Diversas publicações foram feitas e a cidade foi
considerada uma capital do simbolismo brasileiro. E, meio que naturalmente, os
temas gregos cantados pelos simbolistas foram incorporados também às
construções daquele período.
Foi uma overdose do arsenal
mitológico grego: colunas, frontões triangulares, cisnes, lírios, faunos e
muito do branco. Os edifícios da época estão aí para quem duvida: a Praça
Miguel Couto, popularmente conhecida como Pracinha do Batel, o prédio histórico
da Universidade Federal do Paraná e o portal do Passeio Público. Mas nenhum é
mais ostensivo em seu simbolismo que o Templo das Musas.
Asas de águia no frontão: símbolo
dos mensageiros dos deuses greco-romanos. Foto: Marcelo Elias/Arquivo Gazeta do
Povo
Ao largo das principais atrações
da cidade, o templo resiste há 97 anos sem alarde na Vila Izabel.
Construtivamente, obedece aos padrões da época: alvenaria e cobertura de telhas
cerâmicas. Já a fachada reproduz um templo de seis colunas com características
dóricas e um frontão com uma águia. Ocupa uma quadra inteira entre as
silenciosas ruas Bororós e Parintins, com quase 20 mil metros quadrados de área
total, preenchidos quase que completamente por vegetação nativa. “Essa quadra é
o pulmão da Vila Izabel”, brinca o historiador Sergio Odilon Nadalin, professor
de imigração alemã na Universidade Federal do Paraná (UFPR), que mora na região
há algumas décadas.
De acordo com Temístocles
Linhares, uma das mais importantes vozes da crítica literária do Paraná,
falecido em 1993, o simbolismo combinou tanto com o clima da cidade quanto com
a psicologia dos curitibanos. O poeta, tradutor e professor do Centro
Universitário Uninter Ivan Justen Santana explica: “o simbolismo é uma escola
literária e artística que preza o sonho, o nebuloso, as inter-relações
profundas entre artes, entre palavras, notas musicais, cores, formas e aromas.
Por meio do simbolismo, é possível expressar sentimentos sem ser explícito.
Curitiba é uma cidade adequada ao mistério”.
Tesouro bibliográfico
Levantado em 1918, o templo é o
centro de estudos e confraternização do Instituto Neo-Pitagórico, uma espécie
de confraria que se dedica ao desenvolvimento do ser humano por meio do estudo
e da meditação, com base nos versos de ouro de Pitágoras para cultura, verdade,
justiça, liberdade, paz, fraternidade e harmonia, como consta em seu próprio
estatuto. Antes disso, a área do templo era apenas a chácara de seu fundador, o
carioca de São Cristóvão, poeta e professor de história do Ginásio Paranaense,
Dario Vellozo. Junto de Júlio Perneta, Silveira Neto e Antonio Braga, Vellozo
formou o grupo “O Cenáculo”, que editou uma revista simbolista de mesmo nome
entre 1895 e 1897.
Sempre no primeiro domingo de
cada mês, ocorrem encontros públicos que seguem a tradição. No século passado,
como descreve a escritora Alice Ruiz no livro Brasil Imperdível, os
participantes das reuniões trajavam túnicas gregas, usavam codinomes e se
reuniam para trocar ideias e fazer leituras. Com o passar dos anos, o instituto
reuniu uma biblioteca de cair o queixo. Entre as raridades, constava até um
exemplar original da enciclopédia de Diderot e d’Alembert, datada de 1750. Mas,
infelizmente, um incêndio ocasionado por um curto circuito em uma madrugada de
agosto de 1987 consumiu quase tudo. Por meio de doações anônimas, o restauro do
templo foi possível e hoje ele continua a instigar a imaginação de quem passa
pela região.
Homenagem formal à declamadora
Ângela Vargas em 1925. Foto: Arthur Wischral/Casa da Memória.
Estudantes e associados reunidos na Festa da Primavera de 1928. Foto: Dario Vellozo/Casa da Memória