A Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seus artigos
iniciais, nos fala que:
·
Artigo 1° - Todos os seres humanos nascem livres
e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem
agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.
·
Artigo 2° - Todos os seres humanos podem invocar
os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem
distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de
religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de
fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será
feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou
internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse
país ou território independente, sob tutela, autônomo ou sujeito a alguma
limitação de soberania.
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Artigo 3° - Todo indivíduo tem direito à vida,
à liberdade e à segurança pessoal.
Em contra-partida, na compilação de Landmark de Albert
Gallatin Mackey (1807-1881) para a Maçonaria Universal, que é tido por muitos
como o “conjunto de regras imutáveis que deve nortear a maçonaria”, lemos que:
·
XVIII - Por este Landmark, os cadidatos à
Iniciação devem ser isentos de defeitos ou mutilações, livres de nascimento e
maiores. Uma mulher, um aleijado ou um escravo não podem ingressar na
Fraternidade.
Estive visitando alguns sites de Lojas e Potências Maçônicas
e qual não foi minha surpresa quando me deparei com uma foto de um maçom
vestido em trajes de Mestre, em uma loja francesa, em uma cadeira de rodas e
com facies típicas de portador de esclerose múltipla!
Já tinha parado para pensar outras vezes sobre o assunto
“necessidades especiais e maçonaria”, até mesmo por questões particulares e
familiares, mas até então, desconhecia a existência de maçons com tal grau de
deficiência. Foi aí que reacendeu em mim o questionamento sobre alguns
Landmarks da Maçonaria, como o Landmark 18 de Albert Mackey transcrito
anteriormente.
Se a Maçonaria se vale dos preceitos de Igualdade,
Fraternidade, Liberdade e União, defendendo-os e propagando-os, como pode ter
como regra básica de conduta um “artigo” de cunho tão retroativo e
preconceituoso?
Se no passado, mulheres, deficientes físicos e “escravos”,
não eram tidos como seres humanos em pé de igualdade com os “homens”, esse
tempo passou e muita água rolou por de baixo da ponte da história.
Outra incongruência desmedida é o fato de a Maçonaria primar
por ser investigadora das verdades e promotora do bem social e, mesmo assim,
admitir que seus Landmark “sagrados” são dogmas imutáveis, incontestáveis e absolutos.
Que tipo de investigador da verdade é este, que está preso a decretos de algum
“desmiolado” preconceituoso do passado, agrilhoado a uma forma pré-estabelecida
de pensar, tolhido de seu livre-arbítrio e de sua livre-consciência, trilhando
passos já pisados sem poder inquirir um porquê das coisas?
Já era contra o Landmark 18 por ser excludente com as
mulheres, que sempre foram nossas iguais e sempre participaram das sociedades
iniciáticas do passados, das filosóficas, religiosas e afins. A mulher sempre
esteve na Maçonaria desde seu primórdio e só foi “excluída” do seu meio por um
pensamento típico clericalista inglês do Século XVIII, machista, escravagista e
classicista. É este mesmo pensamento que exclui até hoje pessoas de bem,
inteligentes, produtivas, Humanas, de suas lojas, apenas por não cumprirem com
os “padrões de perfeição física” exigidos.
Uma das Maçonas mais encantadoras e inteligentes que conheci
(sim, uma mulher maçona), minha amiga Stella, falou uma vez que os segredos da
Maçonaria residem em seus sinais, palavras e toques especiais e típicos de cada
grau. Sendo assim, ela jamais poderia trair os segredos maçônicos, pois, por
questões pessoais que a impediam de frequentar assiduamente os trabalhos em
loja, muitos desses sinais, toques e palavras ela já havia esquecido ou
confundido. Muito parecido já ouvi de graduados mestre-maçons, que tinham
receio de visitar uma outra Loja, pois não lembravam como se fazer reconhecer
maçons caso isso lhes fosse requisitado.
Assim sendo, se pessoas capacitadas fisicamente podem
“falhar” com os ensinamentos maçônicos e mesmo assim, continuar sendo maçons,
sem maiores problemas, por que vamos impedir que outras pessoas sejam iniciadas
nos mistérios maçônicos, só por não poderem dar um toque ou fazer um sinal? Se
possuem capacidade intelectual para estudar, meditar e se aprimorar
sócio-cultural-moralmente, não lhes falta nada que seja exigido de um candidato
para poder participar dos estudos que os mananciais da maçonaria oferecem a
seus consortes.
Muitos expoentes da cultura, das artes, política e várias
outras áreas do conhecimento humano tinham deficiências e nem por isso foram
menos eficientes em suas atividades. Beethoven compôs a 9ª Sinfonia em Ré menor
quando já estava praticamente surdo e muitos consideram que esta peça é sem
dúvida fruto do ápice de sua genialidade. Antônio Francisco Lisboa, o
Aleijadinho, mesmo mutilado por sua doença (que até hoje não se confirmou o
diagnóstico) continuou esculpindo e em 1796 recebeu uma encomenda de grande
importância, para a realização de esculturas da Via Sacra e os Profetas para o
Santuário de Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, consideradas a sua
obra-prima.
Atualmente, no esporte, vemos atletas de várias idades e
modalidades que são verdadeiras marcas de superação, competindo em olimpíadas e
jogos por todo o mundo, e são chamados de “para-atletas”, pois apresentam
deficiências físicas. Contudo, a despeito de suas deficiências, dão de 10 a 0
em muitas outras pessoas, atletas ou não, com seus “corpos perfeitos”!
Por isso e por vários outros exemplos que temos, sou levado
a crer que nenhuma necessidade especial que alguém possa apresentar é fator
impeditivo absoluto para que o mesmo participe da Maçonaria. Já não somos mais
operativos; não necessitamos de corpos fortes e mão hábeis para realizar as
tarefas de construção e artesanato; nossa obra é realizada com nossa mente e
nossa argamassa é o estudo pautado no discernimento e na razão!
Se é Igualdade, Fraternidade, Liberdade e União que
defendemos e usamos por lema, que o sejam também por nós propagadas a começar
dentro de nossas próprias Vendas e Lojas! Sejamos os exemplos de Igualdade,
pois vãs são as palavras, quando não se acompanham de ações.
Fraternos Abraços!
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