Museu Nacional na Quinta da Boa Vista pega fogo - Uanderson Fernandes / Agência O Globo
Entrei naquele espaço, andei por aqueles corredores, admirei todo aquele acervo, senti a energia do passado... jamais o farei novamente... ninguém nunca mais o fará! Foi numa tarde de sol que eu e minha esposa pudemos apreciar tudo aquilo, respirando um ar com misto de cheiro de poeira do tempo com o mofo do abandono... era triste, mas mesmo assim, deslumbrante. Foi em outubro de 2016 e, naquela época, o edifício já clamava por socorro!
Quase dois anos depois, justamente no duocentenário do prédio do Museu Nacional da Quinta da Boa Vista, que fora residência da Família Imperial Brasileira, sobreveio a tragédia! Um incêndio de proporções dantescas arrasou com tudo! Uma perda lastimável e irreparável: centenas de anos de história do Brasil, milhares de anos de história da humanidade, milhões de anos de história do mundo! Sobraram apenas minerais e meteoritos que, não superam o poder destrutivo do homem, mas ainda suportam o das chamas!
Já há 5 anos havia um projeto de combate de incêndio para ser implantado, que era constantemente barrado pelos entraves burocráticos e exigências legais do IPHAN, BNDES e autoridades estaduais e federais. A liberação de alguns milhões de reais (milhões, sim... mas muito menos do que o governo libera de recursos pra trazer um show internacional para o Brasil, a ingressos de 400,00 reais e que só uma parcela bem seleta da população irá usufruir) teria sido suficiente para evitar uma derrocada cultural como esta!
Parece um absurdo falar em "só alguns milhões de Reais", mas, em se comparando com o que se desvia de verbas para abastecer bolsos escusos e mal-intencionados, o valor é um grão de areia diante de um mar de gastos obscenos e descaso com o bem público.
Um povo sem história é um povo sem futuro! E o Brasil sofre de uma carência crônica de cultura descente e de perspectiva de amanhã melhor.
Meu coração chora a perda, como cidadão, como Brasileiro, como ser humano...
Perdemos todos: o Rio de Janeiro, o Brasil e o Mundo!
Com um acervo de cerca de 20 milhões de itens, era o quinto maior museu de antropologia do mundo e figurava como importante instituição, não só como Museu que era, mas como laboratório de pesquisa. Peças de vestuário e mobiliário da Família Imperial e do Brasil Colônia e Império, fosseis de dinossauros, insetos, animais de todo tipo, artefatos ameríndios desde eras pré-colombianas, múmias e itens egípcios únicos no mundo, que nem no próprio Egito mais existia; tudo virou cinzas e escombros...
É-me impossível deixar de imaginar quanto da população brasileira, e da carioca, em especial, realmente tem a noção do tamanho da perda e mais, que parcela que realmente se importa com isso? Quantas das pessoas que hoje são tomadas de assombro com o que houve, amanhã, ou semana que vem, ou no próximo mês, ainda se lembrarão e se indignarão com o ocorrido?
Entre a labuta diária para ganhar o pão, a angústia da insegurança, a desesperança nas autoridades governamentais que solapam e esfolam a massa humana e a incerteza do que será o dia de amanhã, as fumaças da tragédia vão se dissipando nos ventos do ostracismo e mais um pedaço da história do Brasil e do Mundo vai se perdendo de forma irremediável, silenciosa e solitária.