“CRIME DE RESPONSABILIDADE”
O ESTADO DE S. PAULO
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Novembro 2014 | 02h 03
Quando começou a vir à luz o conteúdo das
investigações da Operação Lava Jato, lançada pela Polícia Federal (PF) em março
deste ano para apurar a corrupção dentro da Petrobrás, houve quem previsse que
a dimensão dessa encrenca poderia comprometer a realização das eleições
presidenciais. Esse vaticínio catastrófico era obviamente exagerado. Mas os
acontecimentos dos últimos dias revelam que esse escândalo sem precedentes não
apenas compromete indelevelmente a imagem da maior empresa brasileira e da
cúpula do partido que controla o governo federal há 12 anos - inclusive o
ex-presidente Lula e a presidente reeleita Dilma Rousseff, como mostramos em
editorial de sexta-feira -, mas pode ser só a ponta de um gigantesco iceberg.
Para ficar apenas nos acontecimentos mais
importantes dessa semana: a empresa holandesa SBM Offshore, fornecedora da
Petrobrás, fez um acordo com o Ministério Público de seu país pelo qual pagará
US$ 240 milhões em multas e ressarcimentos para evitar processo judicial por
ter feito "pagamentos indevidos" para obter contratos no Brasil e em
outros dois países. No Brasil, a CGU iniciou investigações sobre as suspeitas
de que cerca de 20 funcionários da Petrobrás teriam aceitado suborno da empresa
holandesa.
Na quinta-feira, a auditoria
PricewaterhouseCoopers anunciou que não vai assinar o balanço contábil do
terceiro trimestre da Petrobrás - cuja divulgação foi por essa razão adiada -
enquanto não conhecer as conclusões das investigações internas da empresa sobre
o escândalo, por temer o impacto do desvio de recursos sobre os ativos da
petroleira. Trata-se de uma precaução raramente adotada por firmas de auditoria
- o que demonstra a gravidade da situação da Petrobrás.
Na sexta-feira, a Operação Lava Jato
iniciou nova fase, colocando 300 policiais em ação em cinco Estados - São
Paulo, Paraná, Rio de Janeiro, Pernambuco e Minas Gerais - mais o Distrito
Federal, para cumprir 85 mandados de prisão ou de busca contra executivos de
empreiteiras e outros investigados por crimes de organização criminosa,
formação de cartel, corrupção, fraude à Lei de Licitações e lavagem de
dinheiro. Para começar, prenderam no Rio de Janeiro o ex-diretor de Serviços da
Petrobrás Renato Duque, indicado para o cargo por José Dirceu.
Enquanto isso, chega a cerca de uma
dezena o número de investigados da Lava Jato que reivindicam o benefício da
delação premiada, numa demonstração de que quem tem o rabo preso no escândalo
já percebeu que a casa caiu e a melhor opção é entregar os anéis para salvar os
dedos, como já fizeram o ex-diretor Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto
Youssef.
Diante das surpreendentes proporções do
esquema de corrupção armado dentro da maior estatal brasileira com o objetivo
de carrear recursos para o PT e seus aliados, não surpreende que os dois
presidentes da República no poder durante o período em que toda essa lambança
foi praticada soubessem perfeitamente o que estava ocorrendo. Em 2010 - Lula
presidente e Dilma chefe da Casa Civil -, o Palácio do Planalto, por meio de
veto aos dispositivos da lei orçamentária que bloqueavam os recursos, liberou
mais de R$ 13 bilhões para o pagamento de quatro contratos de obras da
Petrobrás, inclusive R$ 6,1 bilhões para a Refinaria Abreu e Lima, em
Pernambuco. O TCU havia chegado à conclusão de que esses custos estavam
superfaturados, mas Lula e Dilma entenderam que era preferível tocar as obras.
Só essa decisão comprova a responsabilidade desses políticos por um escândalo
que deixa o Caso Collor no chinelo.
De fato, está registrada no Diário
Oficial da União a prova documental da conivência de dois presidentes da
República com a corrupção na Petrobrás. É um escândalo de dimensões
mastodônticas que envolve todas as diretorias operacionais da estatal, dezenas
de executivos de empreiteiras e outro tanto de políticos de praticamente todos
os partidos mais importantes da base governista no desvio de recursos estimados
em pelo menos uma dezena de bilhões de reais.
Somente alguém extremamente ingênuo,
coisa que Lula definitivamente não é, poderia ignorar de boa-fé o que se
passava sob suas barbas. Já Dilma Rousseff de tudo participou, como ministra de
Minas e Energia e da Casa Civil e, depois, como presidente da República.
Devem, todos os envolvidos no escândalo,
pagar pelo que fizeram - ou não fizeram.